'É o projeto
mais sofisticado da história da ciência brasileira', afirma diretor.
G1 traz
série com 4 reportagens sobre o centro de pesquisa de Campinas.
Fonte: G1
Maquete do superlabatório Sirius que vai funcionar em Campinas (Foto: Divulgação/ LNLS). |
"É o projeto mais sofisticado da história da ciência brasileira, do ponto de vista de escala, de desenvolvimento interno e tudo que foi projetado e vai ser construído", afirma Antônio José Roque da Silva, diretor do Laboratório Nacional de Luz Síncrotron (LNLS) sobre o projeto Sirius, que teve sua pedra fundamental lançada em dezembro de 2014, em Campinas (SP).
O projeto consiste na construção de um superlaboratório de 68 mil m² em um terreno de 150 mil m² junto ao campus do Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais (Cnpem), onde está instalado o Polo II de Alta Tecnologia. A área total equivale a 21 campos de futebol. Já o custo estimado do Sirius é de, aproximadamente, R$ 1,3 bilhão.
O Sirius irá abrigar um acelerador de partículas, que emitirá uma fonte de luz de alto brilho, a luz síncrotron, que funcionará como uma espécie de mega raio-X e permitirá analisar em escala nanométrica qualquer material. Cerca de 20% da parte civil da obra está pronta. A previsão é de que o laboratório esteja em funcionamento em 2018.
Atualmente, já há um acelerador mais antigo instalado no LNLS. O laboratório é a única fonte de luz síncrotron aberta ao uso da comunidade acadêmica e industrial na América Latina. Mas, segundo o diretor, é necessária uma luz mais brilhante para estudos avançados em áreas como medicina, biologia, química, física e ciências de materiais.
Neste sábado (21) completa 20 anos que os elétrons deram a primeira volta no acelerador de Campinas. Para marcar essa data, o G1 preparou uma série especial sobre o superlaboratório. Serão quatro reportagens que irão contar a história desse relevante projeto da ciência brasileira. Na primeira, entenda o que é e quais são os usos da luz síncrotron.
A luz síncrotron é um tipo de radiação que permite observar átomos e moléculas dentro de qualquer tipo de material. No entanto, ela só é obtida quando os elétrons, que são acelerados em um túnel em formato de anel em velocidade próxima à da luz, têm a sua trajetória desviada por um campo magnético. [veja exemplo no vídeo acima]
"Você fecha um círculo e quando eles fazem essas curvas, eles são acelerados ao longo dessa trajetória tangencialmente e emitem radiação. A grande característica dessa radiação é que ela cobre uma faixa ampla, vai desde o infravermelho, a parte importante é que chega no raio-X, então, você tem uma fonte de raio-X contínua", explica Silva.
O grande diferencial dessa radiação é a intensidade do brilho obtido, que permite analisar e estudar materiais em diferentes áreas do conhecimento em tempo real. "Não existe nenhuma matéria que ela [a luz] não seja capaz de estudar, porque os materiais são compostos de átomos. Ela penetra na matéria, interage, permite que você identifique quais áreas, átomos que compõem determinado material. Incluindo algumas vantagens, o seu alto brilho, intensidade, permite que você faça esses estudos em tempo real", destaca Silva.
Além do uso em tempo real, segundo o diretor, outra vantagem do síncrotron é que vários pesquisadores podem utilizar o produto gerado pelo acelerador de partículas em estações de trabalho de forma simultânea.
"Você distribuiu no entorno desse acelerador essas estações de trabalho, que são chamadas linhas de luz, onde você coleta a radiação que sai. No final é onde os pesquisadores de diferentes áreas do Brasil e do mundo vem fazer os seus experimentos", ressalta.
Os pesquisadores vem de diversas partes do mundo porque, segundo Silva, o síncrotron é a melhor ferramenta para investigar os diversos tipos de materiais existentes, já que penetra e mostra a constituição da matéria. "O raio-X penetra a matéria, então, eu posso enxergar dentro da matéria, penetrar o tecido, um pedaço de solo, cimento e pedaço de aço", destaca.
Silva afirma ainda que é a versatilidade da ferramenta que tem feito crescer o uso da luz síncrotron pelo mundo. "É a ferramenta que mais tem crescido em número de uso pela comunidade de ciência e tecnologia. Na área de medicina, por exemplo, você tem muita gente que vem estudar aqui questões sobre doenças degenerativas. Você tem pesquisadores que tem o interesse de pesquisar proteínas e que pode ter impacto para fármacos", explica.
Ainda segundo o diretor, regularmente, um grupo do Rio de Janeiro visita o LNLS para desenvolver estudos sobre o vírus da zika. "Um grupo do Rio de Janeiro que está utilizando organóides para fazer estudo da influência de zika no cérebro. Esse é um grupo que vem ao síncrotron de forma regular fazer pesquisas em mini cérebros", revela.
Ainda segundo o diretor, regularmente, um grupo do Rio de Janeiro visita o LNLS para desenvolver estudos sobre o vírus da zika. "Um grupo do Rio de Janeiro que está utilizando organóides para fazer estudo da influência de zika no cérebro. Esse é um grupo que vem ao síncrotron de forma regular fazer pesquisas em mini cérebros", revela.
O pesquisador explica ainda que o que vai determinar o tipo de experimento que pode ser realizado no laboratório depende de algumas características do acelerador de partículas. A primeira é que quanto maior a energia dos elétrons, maior será a luz que sai do raio-X para os estudos.
"Então, quanto maior a energia, maior vai ser a energia do raio-X que sai. E por que é importante ter raio-X de alta energia? Porque ele penetra mais os materiais e permite que você faça mais estudos", afirma.
Outra questão, segundo Silva, é um parâmetro técnico chamado de emitância da máquina.
"Eu sempre comparo uma lanterna com uma ponteira laser. Então, uma lanterna tem uma área emissora grande e uma divergência grande. É bom se eu quiser iluminar uma sala, porque a radiação se espalha e eu enxergo uma região grande. Se eu quiser estudar uma pequena região, ela não é o melhor, porque eu não concentro a radiação. Uma ponteira laser tem uma área pequena e principalmente, tem uma divergência pequena, toda aquela luz não se espalha. Ele tem área menor, abertura angular menor, emitância menor e brilho mais alto", argumenta.
Além disso, existe uma outra característica chamada coerência, que é importante para reconstruir as propriedades dos materiais. "Imagina a onda lá do mar, ela tem lá na frente um anteparo que tem buraco, por exemplo, então algumas vão bater e voltar, outras vão atravessar e seguir em frente. Se todo mundo que bateu naquele anteparo está em fase, elas vão ser espalhadas e lá na frente elas vão interagir, ou interferir. E aquele padrão de interferência, ele agora carrega informação da distribuição dos buraquinhos que tinha lá no anteparo. Se eu examinar aquele padrão de interferência é possível reconstruir a informação do centro que espalhou. [...] E é isso que as luzes de síncrotron modernas têm", destaca.
Ainda segundo o diretor, essas características da luz síncrotron explicam sua importância tanto para pesquisa quanto para o mercado e reafirmam a necessidade do Brasil ter seu próprio laboratório.
Para Silva, o laboratório que está sendo construído em Campinas vem para colocar o país entre os maiores produtores de tecnologia do mundo.
"Em 30 anos, você sai da estaca zero e passa a ter um projeto que é liderança mundial", finaliza o diretor do laboratório.
Na segunda reportagem, conheça a história do LNLS e como apenas com tecnologia nacional se criou o primeiro e único laboratório de luz síncrotron da América Latina.
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